Tenho que usar a chave da boa vontade para que eu possa abrir quantas portas eu necessitar. Estou no A.A. há 10 anos e sem beber. Iniciei a beber com 16 anos e continuei bebendo até os 28 anos. Bebia na brincadeira e fui aumentando cada vez mais a dose, sem parar nem um dia. Tive muitas perdas, deixei tudo dentro de um copo sujo de bebida. Fico refletindo meu passado. Diz uma passagem de A.A.;: "nunca se esqueça dos últimos dias de bebedeira". Passados alguns anos, vejo o quanto me fez bem essa sugestão, por eu ter cavado o fundo do meu poço. Nessa trajetória acumulei várias experiências de bebedor problema. Eu pensava que bebia socialmente; puro engano meu. Encontrava-me totalmente desequilibrado, quebrado financeiramente, fraco espiritualmente, sem rumo. A verdade é que eu não tinha mais em que me segurar. Tinha uma opinião desastrosa de todos e tudo, o mínimo de lucidez, nenhum projeto de vida, sem sentido. Fiz do alcoolismo uma verdadeira fuga estratégica, tornando-me um problema para mim e para os outros. Chegava a minha casa caindo de bêbado, altas horas da noite. Minha esposa sempre estava me esperando com o jantar no forno. Recolhia-me para dentro de casa, ajudava-me até a tomar banho para curar um pouco a ressaca, limpar meus vômitos na roupa. Estava igual um porco. No outro dia tinha que trabalhar, não se sabe como. Por isso digo sempre que "mães ou esposas de alcoólicos serão sempre santas, sem nunca ter recebido nenhum título do PAPA". Porque eu, no meu alcoolismo desenfreado, deixava todos doentes com aquela situação, minha família sempre ficava chorando. Durante umas das minhas várias bebedeiras, conversando com o cara do espelho da minha casa, tinha que decidir mudar minha vida. Como fazer isso? Por acaso, um vizinho convidou-me a participar da reunião do A.A., cansado de me ver chegar todos os dias caindo de bêbado. De cara neguei o convite. "HOJE NÃO VOU A NENHUMA REUNIÃO". Continuei sem freio, bebendo, achando que podia por mais 15 dias, de uma forma mais veloz e intensa, chegando mais rápido à beira do abismo, no fundo do meu poço. Uma noite, sei lá como cheguei, estava totalmente bêbado. Procurei novamente meu vizinho. Pedi-lhe implorando: " ajude-me, vamos àquela TAL REUNIÃO DE A.A.". Então, fomos à minha primeira reunião. Mas tive que passar no bar para tomar uma saideira, criando coragem de conhecer algo totalmente desconhecido para mim. Cheguei à sala de reunião do A.A., pouco entendi. A não ser, naquele momento, umas saraivadas de desabafos, sendo a maioria direcionada a mim mesmo. Fui logo retrucando ao meu vizinho: "Como essas pessoas nem me conhecem e sabem tudo da minha vida, sendo que a maioria dessas pessoas nem eu conheço?". Foi-me respondido que as nossas histórias de alcoólicos são iguais, somente muda o personagem. Isso me impressionou muito. Fui observando os vários depoimentos. Naquele momento, encontrei-me junto a meus iguais. Ficando bastante desconfiado, pensei: "mas é possível esse fato?". No decorrer da reunião foi lida a literatura do Primeiro Passo. Fui me acalmando, me informando melhor. Hoje tenho outra visão de tudo. Consigo aproveitar, valorizando melhor a vida. Naquele exato momento recebi minha primeira lição de vida. Que a vida no alcoolismo, no mundo da ilusão, não era como eu achava e pensava. Ali eu tive que achar uma maneira de mudar de vida. Ingressei no A.A. Agarrei-me à única tábua de salvação, nesse grande Oceano para que um dia o Poder Superior me encontrasse. Quebrei a viola da minha vida. Ela ficou em vários cacos. Hoje, com todos os meus irmãos do A.A., estou tentando sempre consertar esta viola. Vou consertando, pedacinho por pedacinho, nem que leve a vida toda. Espero que nunca termine de consertar, senão vou achar que já estou curado, ou pensar que já sei tudo em A.A. Hoje sou totalmente livre, mas sou um sujeito bastante limitado pela minha doença do alcoolismo, pois ela é incurável, progressiva e fatal. Tenho que usar a chave da boa vontade para que eu possa abrir quantas portas eu necessitar. Estarei sempre agradecido a essa Irmandade que me resgatou, me ajudando a ser inserido na sociedade novamente. Aqui aprendi muitas coisas boas e sei que esses dois "A" significam muito para mim, e querem dizer primeiro, ACEITAÇÃO-AÇÃO-ATITUDE-AJUDA-AMOR e o mais importante, AQUI E AGORA. Sem a bebida fui trazido para uma nova vida, foi devolvida minha sanidade mental e espiritual. "BOM É ESTAR SEMPRE SÓBRIO, MAS O MELHOR DE TUDO É VIVER SÓBRIO". Desejo a todos muitas 24 horas da tranquila e saudável sobriedade necessária. OBS: últimas palavras de Robert Smith (Dr. Bob.) - É melhor mantermos os pés firmes no chão. Nós aprendemos por uma dura experiência que os Alcoólicos precisam do Anonimato, para protegê-los de estigmas sociais, e para manter seus egos tolos sob controle. Lauro Elias São José dos Pinhais/PR Vivência nº 130 - Março/Abril/2011 |